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6 dias na África do Sul em 2004 – e 1534Km rodados na mão inglesa!!!

30 DE MARÇO

Porto Alegre/RS/Brasil: (1° dia)

No dia do nosso embarque, a Polícia Federal fazia greve geral reivindicando reajuste de salário, o que fez com que os passageiros nos embarques, desembarques, e imigração nos aeroportos do Brasil todo passassem por momentos de apreensão, pois os vôos estavam atrasando e as conexões ficavam prejudicadas, a ponto de muitos passageiros perderem alguns vôos. As notícias na televisão diziam que os passageiros teriam que chegar ao aeroporto para o check-in com 4 horas de antecedência. E foi o que fizemos, 4 horas antes do horário previsto para o vôo, estávamos no Aeroporto Salgado Filho prontos, quando nos deparamos com um aeroporto vazio e sem filas.

Saímos de POA num avião da Varig (RG-2318) exatamente às 12h, o vôo foi bem tranqüilo, sem turbulência alguma, mas definitivamente não consigo esconder totalmente as crises de nervos que sofro quando entro numa aircraft. As comissárias de vôo ainda têm o trabalho de explicar como proceder em um possível pouso de emergência na água o que, na minha concepção de sobrevivência, é o mesmo que pular do último andar de um edifício como as “Petronas” e cair de pé, sem ao menos machucar um dedinho, fácil!

Chegamos a São Paulo depois de uma hora e meia de vôo, então realmente vimos onde a Polícia Federal fazia falta. O aeroporto de Guarulhos parecia estar parado, o check-in demorou mais de uma hora, mas como o nosso vôo para Johanesburgo seria somente às 17h40min, o tempo de espera foi o suficiente para não termos problemas no embarque do vôo da South African Airways.

Na sala de embarque tive a primeira, ou melhor, a segunda sensação de angústia – depois de voar. Vi o avião da SAA aterrisar, desembarcar passageiros, abastecer combustível e gêneros, quando todos que estavam esperando conosco para embarcar começaram a se movimentar. Não acreditei que embarcaríamos naquele avião, pois ele acabara de chegar da África do Sul, depois de voar 4.300 milhas, cerca de 7.000 km, atravessar o Oceano Atlântico e já ia voltar?? Não me conformei, comentei com a Claudia e ela simplesmente concordou, sem ao mínimo se interessar pelo assunto. Mais inconformado ainda perguntei ao funcionário do balcão do embarque: - É esse o avião para Johanesburgo? E ele, com a maior naturalidade e educação, respondeu: - Sim, senhor, o embarque já vai ser liberado! - E a manutenção deste monstrão quando é que fazem??? - pensei, já que se perguntasse, com certeza passaria, no mínimo, vergonha. Depois fiquei sabendo que o trecho São Paulo – Johanesburgo é feito por uma única aeronave 3 vezes por semana e que a manutenção é feita nos intervalos, já que as companhias aéreas mantêm o avião ao máximo no ar: avião em terra é dinheiro parado, dizem.

Começavam então as sucessivas crises de desespero (até que) controláveis de minha parte. O que era angústia para mim, era curtição e felicidade para a Claudia. Na porta do avião, as comissárias saudavam os passageiros: - Good night, lady, good night, gentleman! Claudia respondeu com naturalidade: - Good night! Eu respondi à altura, como se meu inglês fosse realmente assíduo: - Good night!!! E logo pensei: - My God! Ninguém fala português nessa p... desse avião!!

Quando começaram os avisos, meu moral foi pro espaço! Perguntava para a Claudia a cada 30 segundos, o que ele disse? O que ele disse? Na decolagem, enquanto o Comandante não falasse e a Claudia traduzisse, eu não descansava.

O avião era um luxo, telas de vídeo individuais, com várias opções de filmes, jogos, músicas, documentários e até uma câmera externa que nos permitia ver imagens de fora do avião. Como tudo era em inglês, optei por passar a viagem inteira (cerca de 8h30min) - sem dormir obviamente - acompanhando na telinha o deslocamento do avião sobre o Oceano Atlântico, sua velocidade, temperatura externa, milhas percorridas, milhas a percorrer...

O serviço de bordo era impecável, vinho sul-africano que não terminava mais, eu só dizia red wine, red wine, please! E lá vinha mais uma garrafinha de vinho tinto.

A África do Sul está 5 horas adiantada do Brasil, e Johanesburgo é conhecida por ser uma cidade muito violenta, mais ainda que São Paulo e Rio de Janeiro. Então fomos bem avisados das precauções que teríamos que tomar, principalmente com relação ao nosso dinheiro, que era em espécie e estava nas pochetes internas.


31 DE MARÇO

Johannesburg/Gauteng/África do Sul: (2° dia)

Chegamos a Jo’burg às 7 da manhã. Já de dentro do avião, na aterrissagem, vimos o que talvez, inicialmente, fosse o mais diferente: a mão inglesa das estradas, veículos indo pela mão esquerda e vindo pela mão direita, um barato.

No saguão do aeroporto, um leve choque cultural, pessoas de todas as raças e religiões, de surfistas com suas pranchas imensas a muçulmanas com seus “pretinhos básicos” e também hare krishnas.

Claudia havia reservado um albergue (The Backpacker’s Ritz) já antes de sair do Brasil, que tinha como cortesia o transporte aeroporto – albergue. Trocamos dólares americanos por rands (a moeda oficial da África do Sul, cuja cotação era de US$ 1 = Rd 6), e após algum tempo de procura, finalmente encontramos o motorista do dito albergue.

Pegamos a van do Zulu, e a minha primeira observação foi: - Claudia, olha onde está o volante!! Estávamos realmente excitados com aquela situação. Volante do lado direito, marcha do lado esquerdo, e os pedais? O trânsito era muito veloz, não dava para entender como aquela gente dirigia tão rapidamente com tudo ao contrário de nós (claro que se colocasse um africano daqueles dirigindo em Jaguarão, no carro mais fácil de guiar, aposto que encontraria o primeiro poste na sua frente).

Novamente a preocupação pegou. Nossa intenção na África do Sul era conhecer Soweto (bairro no sudoeste de Jo’burg cujo nome significa SOuth WEst TOwn e que foi o epicentro de todos os acontecimentos políticos-raciais que a África do Sul atravessou, inclusive o apartheid), alugar um carro e percorrer o país até o Kruger Park e o Blade River Canyon, que ficam no nordeste do país, e nós estávamos no centro.

Dei a seguinte missão para Claudia: saber do motorista Zulu como se dirige um carro com volante na direita. Depois de algum tempo de conversa entre eles, com a van numa velocidade de 100 km/h quando no Brasil não se cogitaria passar de 40 km/h, paramos na rodoviária de Jo’burg para o embarque de duas escandinavas, que por sinal, no fim de sua viagem, viriam ao Brasil, quando então a Claudia me explicou tudo:

- Tudo é exatamente como em nossos carros. As marchas são na mesma posição, não muda nada. Os pedais, a mesma coisa, o acelerador é o da direita, o freio é o do meio e a embreagem o da esquerda. Só o que muda é o lado do volante (é na direita), o trânsito é na esquerda e, nos cruzamentos, complica um pouco, porque mesmo com a sinaleira aberta, na hora de fazer uma conversão para a direita, temos que esperar que o fluxo na mão contrária termine para que se possa seguir adiante.

Diante de uma explicação tão sucinta, resolvi nem perguntar como se ultrapassava outro carro. Decidi então, observar detalhadamente as ações do motorista, me perguntando como iríamos praticamente atravessar o país diante do complicado trânsito de mão inglesa.

No caminho, observando a paisagem e o povo, não me distanciei tanto das minhas raízes como eu pensava que fosse acontecer quando visitasse um país tão diferente como a África do Sul, por exemplo. Talvez não tivesse ainda “caído a ficha” de que nós estávamos em outro continente, a 7.000 km de distância de casa.

Nas ruas, aquele trânsito do avesso e frenético. Nas calçadas, aquele povo de maioria absoluta negra e pobre, homens altos e fortes, que vestiam roupas coloridas e tinham caras de poucos amigos, parecia que, a cada esquina que parávamos na sinaleira, alguns deles iriam nos abordar com uma arma e roubar tudo o que tínhamos – não é à toa que, em certos bairros, os veículos não paravam nem nas sinaleiras.

Johannesburgo realmente não é uma cidade bonita, aliás, fica bem longe disso. É uma cidade muito grande, estressante, com grandes edifícios, tudo é longe, além do custo de vida ser bem mais caro que no Brasil. É o centro comercial e industrial do país, por isso é a capital da África do Sul. Pode ser comparada à São Paulo.

Chegamos ao albergue. Tinha gente do mundo inteiro, chegando, saindo, comendo pratos feitos na mesa da recepção, de pijamas, alguns com pressa, outros com total ausência dela. Tinha um japonês que me chamou a atenção pela sua falta de contato com o mundo exterior, andava pelo pátio do albergue com o pensamento longe, parecia que o que estava ali era somente sua carcaça, vestida de trapos. Já me animei, porque pensei que fosse alguém como eu, que não falava inglês e estava tentando se isolar para não passar trabalho. Total engano, logo o vi pedindo informação, para em seguida desaparecer do universo em sua nave estelar.

Claudia tratou de resolver tudo na recepção e já reservar um tour por Soweto à tarde com um recepcionista que era uma versão insana de Jim Carrey. O cara não parava de falar um minuto só (com certeza foi isso que me aborreceu, pois eu entendia, com muito esforço, meros 5% do que ele dizia, falava rápido demais e em inglês, obviamente). E ainda falava comigo, fazia perguntas e ria. No início até achava engraçado, mas minha paciência foi diminuindo ao ponto de ficar de mau humor e ensaiar palavrões em português para responder em futuras “provocações”, no meu entender.

Não foi necessário, pois a Claudia teve a paciência de traduzir tudo o que era dito nas explicações das regras do albergue. Naquele momento, me penitenciava por não saber (e não ao menos tentar) falar inglês, quando resolvi começar a prestar atenção em tudo o que diziam, mas só ouvir, porque as palavras não saíam. Estava desmoralizado!
Almoçamos num shopping center perto do albergue, onde compramos um mapa rodoviário da África do Sul, passeamos um pouco pelas lojas, que nada tinham de interessante, e voltamos.

Embarcamos em outra van, desta vez para ir a Soweto. Um city tour completo, com um motorista nascido na Suazilândia falando o tempo todo e a Claudia traduzindo. Explicação completa sobre o apartheid, vimos as casas de Tutu Desmond, Nelson e Winnie Mandela. Entramos também no Memorial Hector Peterson, onde entendemos a história da imposição da língua afrikaans e a sua oposição, a Guerra Civil Africana, enfim, um banho de cultura sul-africana em uma tarde.

Na volta, paramos em um barzinho ainda em Soweto, onde um pai zulu tocava uma viola de 12 cordas e, à frente dele, 5 meninas cantavam e dançavam uma coreografia nitidamente local. Aproveitamos para observar a apresentação e comprar deles uma máscara artesanal africana.

Voltamos ao albergue às 17h30min, tomamos um banho e subimos para o quarto. O dormitório era oval e tinha aproximadamente 12 beliches. Tínhamos reservado um onde eu dormia em cima e a Claudia na cama de baixo, quando percebemos que no beliche ao lado estava deitado um rapaz. Percebemos que, de manhã quando chegamos ao albergue, ele já estava ali, dormindo, e quando voltamos do almoço também estava ali, dormindo, sendo que, às 19h, quando nos deitamos, ele continuava ali, imóvel, quando perguntei a Claudia:

- Será que esse cara tá morto? Sempre que a gente vem aqui ele está ali, dentro de um saco de dormir na cama inferior do beliche!

Caímos na risada, mas decidimos dormir, já que o cansaço era enorme. Eu já estava há mais de 30 horas sem pestanejar e, finalmente em terra firme, era hora de fazê-lo.


1° DE ABRIL

Johannesburg/Gauteng/África do Sul: (3° dia)

Acordamos às 8h30min, mas desde as 5h já ouvia os ruídos dos companheiros de dormitório ajeitando as suas tralhas para sair ou daqueles que estavam chegando. O albergue é bem destinado a mochileiros, e essa gente não tem hora nem para chegar, nem tampouco para sair.

Quando me virei, ainda em cima da cama, para dar um good morning à Claudia, a primeira coisa que avistei foi o nosso vizinho de beliche exatamente no mesmo lugar onde eu o vira em três ocasiões no dia anterior, e não exitei:

- Claudia, dá uma olhadinha para a tua direita!

- Não é possível, esse cara deve ter tomado uma cartela inteira de Lexotan para esquecer que existe!

O dia estava começando, e no albergue mesmo solicitamos, digo, a Claudia solicitou um carro de uma locadora de veículos. Nossa intenção era alugar um carrinho pequeno e econômico para ir até Pretória, Kruger Park e Blade River Canyon. Se desse tempo, quem sabe, uma chegadinha na Suazilândia.

Ainda na recepção do albergue, depois de várias tentativas com o cartão de crédito da Claudia, resolvemos tentar com o meu, que na primeira passada pelo leitor foi aceito. Mais um probleminha estava resolvido.

Estávamos esperando o carro na recepção do albergue quando o clone do Jim Carrey berrou: - Your caaaaaar!!!! Nem deu tempo de chamá-lo de imbecil, porque estava concentrado no estresse que me esperava.

Ainda no Brasil, tivemos a informação de que, para dirigir na África do Sul, o motorista deveria ter Carteira Internacional de Habilitação. Imediatamente a Claudia a providenciou, pagando uma taxa de R$ 90,00 na época, já que não valeria a pena eu tirá-la porque a minha CNH já estava vencendo, então terminaria o prazo de validade da internacional também.

Quando nos deparamos com o funcionário da locadora e o Palio 1.3 com volante na direita pensei:

- Como que a Claudia vai sair daqui dirigindo esse negócio até sumir das vistas do funcionário para então eu pegar a direção? Pois obviamente ele exigiria que o motorista tivesse a carteira internacional.

Não foi bem assim. Enquanto a Claudia assinava o contrato de locação, eu inspecionava o carro. Ainda observei uma turista de aproximadamente 20 anos de idade saindo num Toyota com a maior naturalidade, dirigindo tranquilamente. Aumentou mais ainda o meu compromisso com o caso.

O locador fez várias advertências com relação ao estado do automóvel, ao trânsito, às condições de entrega (que seria dali a 3 dias no aeroporto, já no dia do vôo a Mumbai, na Índia, nosso próximo destino), mas nem sequer tocou no assunto da Carteira Internacional. Com isso, tomei a dianteira e, terminando os acertos de contrato, fomos logo entrando no carro, eu na direita, pois iria guiar, e a Claudia na esquerda, a co-piloto.

Inesperadamente, o rapaz da locadora, bem apessoado, mas tapado de espinhas no rosto e suando bastante, aproximou-se da minha janela e falou uma última coisa que eu não entendi, então perguntei a Claudia:

- O que ele disse?

- Ele perguntou se tu sabes dirigir esse carro – respondeu ela.

Com a maior convicção respondi:

- YES!!

Fechamos as portas e, por alguns segundos, olhamos um para o outro com a seguinte pergunta em mente:

- Como se dirige essa droga desse carro?

Enquanto isso, o locador estava do lado de fora do veículo, esperando que saíssemos, talvez porque quisesse ir embora também, ou então para ver o que aconteceria com aquela dupla que fingia não estar acontecendo nada.

Liguei o carro, com a mão esquerda. Engatei a primeira marcha, com a mão esquerda. – E agora? Para onde vamos?

O rapaz tinha estacionado o carro de ré numa rua sem saída, então o que eu tinha que fazer era manobrá-lo e sair tranquilamente.

Foi o que fiz. Mas é tudo muito estranho, o espelho retrovisor é na esquerda e a toda hora eu olhava para a janela à direita tentando achá-lo, as marchas arranhavam pela inexistência de prática com a mão esquerda, e o pior, a falta de noção de espaço do lado dianteiro esquerdo do carro.

Na saída até que foi tudo bem, o problema era que dali a 80m havia uma avenida do porte da Ipiranga em Porto Alegre, mas sem o Arroio Dilúvio no meio, ou seja, pânico total.

Paramos na esquina da rua sem saída, verificamos no mapa onde ficava a saída para Pretória - nosso próximo destino - identifiquei qual pista pegaria, respirei fundo e seja o que Deus quiser!

Arranquei com aquele carro como se fosse um Fórmula 1, “queimando pneu”, porque a velocidade que eles trafegam é eletrizante, e se andar devagar, passam por cima, então tentava acompanhar. Mas como tudo é uma questão de prática, logo me ambientei à nova aventura.

Claudia era a co-piloto, pedia informação para outros carros na sinaleira e controlava o mapa na direção de Pretória (norte). Eu tinha que ter 110% de atenção no trânsito e ainda na ação de trocar as marchas. Pegamos a R55 e a N14, 2 freeways de dar inveja, que nos conduziram até o centro de Pretória depois de 58km percorridos desde Johannesburgo. Neste momento, minha confiança era tão grande na direção que já estava até arriscando umas ultrapassagens, pela direita, é claro!

Pretória é uma cidade linda, lembra Buenos Aires, bem menor que Johannesburgo e é tudo muito bem cuidado e tem um grande valor histórico desde a colonização da África do Sul.

Caímos justamente no coração de Pretória, na Church Square. Estacionamos o carro ali mesmo na rua, com um manobrista em cima dizendo que cuidaria muito bem do veículo. Isso me lembrou algum lugar que eu conheço!

Fomos caminhar um pouco, sentir a praça central da cidade, que comporta uma grande estátua de Paul Kruger, a prefeitura e uma igreja. Sentamos no gramado desta praça assim como fazem os locais. Eu estava tentando descarregar todo o estresse do trânsito acumulado no gramado e a Claudia lendo os livrinhos que pegara nas informações turísticas e já inventando um novo destino para as próximas horas.

Resolvemos então visitar o Voortrekker Monument, que fica fora da cidade, numa colina de onde se avista Pretória.

Quando entramos no carro, imediatamente os “guardadores” surgiram pedindo dinheiro por terem bem cuidado do carro. Peguei uma moeda de 5 rands, que equivale a quase R$ 1,00, e dei para a Claudia entregá-la no momento em que eu arrancasse com o carro, para evitar uma possível represália por ter dado pouco dinheiro.

Claudia passou a moeda a ele, que imediatamente começou a gritar - em zulu, é claro - chamando seus colegas. Já com o carro em movimento, 2 deles nos acompanharam ao lado por alguns bons metros, gritando muito (certamente nos xingando), quando trancamos as portas e aí sim me distanciei pela velocidade do carro. Sinceramente não esperava que a retaliação fosse tão forte, hehehe...

Saindo pela N14, chegamos ao Voortrekker Monument, um prédio altíssimo, com apenas 3 andares, construído em memória dos holandeses que morreram no BIG TREK (a grande caminhada para colonizar o norte) e dos peregrinos que morreram na Guerra dos Bôeres. É um parque fechado que comporta um cemitério, cabanas zulus (exatamente como aquelas que vemos em filmes africanos) e um forte (Fort Schanzkop). É um ponto turístico importante na cidade, e Pretória fica ainda mais bonita lá de cima.

Embarcamos em nosso Palio 1.3 com destino a Nelspruit pela N4, em direção a Witbank. Quando estávamos saindo do Voortrekker Monument, meus reflexos no trânsito do avesso já estavam bem adaptados (pelo menos era o que eu pensava), quando em um cruzamento em que iríamos converter à direita simplesmente entrei na contramão de direção, causando um alvoroço.

Freadas na pista, os motoristas que vinham na direção contrária não entendiam o que estava acontecendo, pânico total.

E a Claudia dizia: - É por aqui, é por aqui!! Mas não apontava a direção certa.

Rapidamente tentei reverter aquela situação, buzinando (sem querer), ligando o limpador de pára-brisas (por descuido), queimando pneu, enfim, um “mico” generalizado!

Finalmente pegamos a rota correta e seguimos viagem, agora com um pouco mais de tranquilidade. As freeways na África do Sul não são muito movimentadas, o que possibilitava-nos fazer uma boa viagem.

De Pretória até Nelspruit são 337 km pela N4. Quando nos aproximamos de Witbank, havia uma bifurcação, ou seja, a decisão sobre qual via pegar deveria ser rápida, o que não aconteceu. A Claudia estava com o mapa, eu estava tentando me guiar pelas placas, e não conseguimos, a tempo, chegar a um consenso sobre qual rodovia pegar. Acabamos chegando próximo demais do alambrado que dividia a cabeceira da bifurcação da pista, cerca de um palmo. Meu coração parecia que ia saltar pela boca, imaginando a grana que gastaríamos com a franquia do seguro da locadora de veículos.

Mais uma “barbeiragem” à brasileira. Ficávamos imaginando o que os outros motoristas pensavam sobre a minha atuação na direção daquele carro. Iniciante? Cego? Problema mecânico?

Às vezes dava vontade até de justificar que não éramos dali, que era a minha primeira vez na mão inglesa, mas seria perda de tempo. Eu estava com a camiseta do Grêmio, talvez se dessem conta que eu era brasileiro! É claro que não, ninguém conhece o Grêmio lá, ainda mais na atualidade desastrosa de suas colocações no Campeonato Brasileiro! Melhor colocar um cartaz no carro...

Seguimos viagem.

Chegamos a Nelspruit, já na Província de MPUMALANGA. Mais 55km e chegaríamos a Hazyview, porta de entrada para o Kruger Park.

Caiu a noite. Em momento algum cheguei a pensar como seria dirigir à noite por lá. Foi um inferno! Na R538, que liga Nelspruit a Hazyview, não existe acostamento, as pessoas andam nas bordas da pista e, para completar, todos os carros que passavam por nós tinham os faróis desregulados, alguns até sem eles.

Depois de muitos sustos e desvios abruptos de pessoas e de outros carros, às 19h30min chegamos ao BIG 5 BACKPACKER’S. Era um albergue encravado na mata, estava vazio, com pererecas por todos os lados, mas os quartos até que não eram ruins. Enquanto Claudia acertava o pagamento do quarto e pegava várias informações sobre o Kruger Park, eu descarregava as nossas coisas. Retirei a pochete e percebei que os bilhetes aéreos estavam completamente borrados pelo suor do corpo. Pensei: - Estava demorando muito para alguma coisa dar errado!

Quando a Claudia voltou ao quarto, se deparou com todos os meus bilhetes pendurados para secar na cabeceira da cama. Mais uma vez a minha preocupação era a diversão dela.

Às 21h, após mais um dia cheio, jogamos nossas carcaças em cima das camas e descansamos, pois o dia seguinte seria bem longo. Planejávamos conhecer o tão famoso Kruger National Park.


02 DE ABRIL

Hazyview/Mpumalanga/África do Sul: (4° dia)

Despertamos às 5h e seguimos para o NUMBI GATE, portão de entrada a sudoeste do Kruger Park.

O nascer do sol estava lindíssimo. Pegamos o carro e cerca de 20Km depois estávamos na entrada do parque nacional. Tínhamos a informação de que deveríamos chegar cedo e foi o que fizemos, mas todo mundo chega cedo, então a compra das entradas não foi tão rápida como pensávamos.

Enquanto Claudia comprava as entradas, fiquei no estacionamento da entrada do parque, só observando o que acontecia por ali.

Existem 3 tipos de turistas que visitam as reservas africanas: os que vão por conta própria como nós – que alugam um carro e entram no parque por conta própria, assumindo todas as responsabilidades com seus veículos e possíveis ataques de animais selvagens; os que vão ao parque em excursões com ônibus fretado e tudo o que têm direito (do tipo "deixa que eu faço por você"), inclusive a condução desse pessoal dentro do parque é feita em Jeepões de uns 2 metros de altura com proteções laterais, teto, motorista, etc (bem como se vê em filmes sobre safáris na África), e ainda aqueles que vão em temporadas determinadas para caçar (não vimos nenhum desses, até mesmo porque no Kruger Park a caça é totalmente proibida).

Quando observava os turistas descendo dos ônibus, estampava-se em meu semblante um alento: havia alguns que desciam e nem sabiam onde estavam, talvez nem soubessem o que estavam fazendo ali, talvez nem seus próprios nomes soubessem. Ao menos eu sabia que estávamos ali para ver os famosos BIG FIVE.

“BIG FIVE” é uma expressão usada pelo pessoal dos parques, que quer dizer “Os Grandes Cinco”. Cinco são os animais que devemos encontrar para poder sair do parque nacional com a “missão cumprida”, o que geralmente poucas pessoas conseguem fazer em apenas um dia de safári. São eles: o leopardo, o rinoceronte, o elefante, o búfalo e o leão. Estava aí o nosso próximo objetivo: encontrá-los.

Claudia voltou para o carro com as entradas na mão, passamos a cancela e logo pegamos uma estrada de terra à esquerda (Albasini Road) de quem entra pelo Numbi Gate.

A vegetação era a legítima savana africana. Iniciamos o percurso a 15km/h, pois não é permitido muito mais que isso dentro do parque (sob pena de atropelar algum animal).

Estávamos nas nuvens, realmente curtindo uma de “África dos meus sonhos”, tentando observar tudo à nossa volta. Deparamo-nos com um veado (no bom sentido), ali na savana, paradinho, parecia uma estátua. Seguimos adiante e não demorou muito para encontrarmos uma diversidade imensa de animais: tartarugas, pássaros de todos os tipos, veados às centenas, zebras, bestas, hienas e cachorros selvagens, esquilos, furões, javalis, macacos babuínos, lagartos, hipopótamos. Inesperadamente, após uma curva, nos deparamos com 2 monstrões de carapaça cinza - eram os nossos primeiros “BIG FIVE”, 2 enormes rinocerontes no meio da estrada, que ficaram ali por uns 10 minutos, bloqueando totalmente a nossa passagem.

Cansado de esperar, inclusive que fizessem suas necessidades fisiológicas, tentei esboçar (de dentro do carro, obviamente) uma certa pressa em ultrapassá-los. O macho do casal não entendeu minha forma sutil de arrancar com o carro lentamente para poder seguir pela estrada e imediatamente virou-se em nossa direção e ensaiou o que eu chamaria de um ataque. Rapidamente engatei a marcha-ré e recuei. Estávamos com problemas!

Só de pensar que o chifre daquele rino poderia atravessar uma porta do frágil Palio como se fosse uma folha de papel, ou até mesmo levantá-lo facilmente, resolvemos esperar até que o romântico casalzinho decidisse abandonar a estrada para que pudéssemos passar.

Mais 10 minutos de espera, e muitas fotografias depois, os 2 gigantes resolveram entrar mato adentro, nos liberando.

Chegamos a Skukuza pela H11, um grande paradouro ao sul do Kruger Park, com diversas lojas, restaurantes, museu, banheiros, etc. Não ficamos muito tempo ali, pois logo seguimos até Lower Sabie pela H4-1, outro grande paradouro onde almoçamos e telefonamos para casa.

Em Skukuza tem um grande mural com o mapa do parque, e os turistas que passam por ali marcam com alfinetes os locais onde viram algum dos BIG FIVE, facilitando assim o encontro daqueles que adiante passarem pelo local indicado. Marcamos o local onde encontramos os rinocerontes.

No caminho, mais animais. Águias, tucanos, o garboso kudu - um veado do tamanho de um cavalo, girafas às dúzias, mais rinocerontes, etc.

Saímos de Lower Sabie pela H4-2 (Gomodwane Road), para regressar até o Numbi Gate, pois já passava das 2h30min e ainda tínhamos mais de 100km para andar.

Quando estávamos na H5 (Randspruit Road), observando a savana, 3 leões viraram a curva à nossa frente, vindo em nossa direção em um trote acelerado. Rapidamente fechamos as janelas do carro. Com um calor de 30°C, não estava muito agradável lá dentro, mas bem melhor do que na companhia de um leão selvagem tentando “fazer uma boquinha” conosco.

Aquilo foi muito rápido:

- Claudia!! A máquina fotográfica!! Olha quem tá vindo!! – gritei entusiasmado.

- Fecha a janela! Rápido!! – ela respondeu, trêmula.

- A máquina! A máquina!! – repeti, para não perder a oportunidade.

Os leões vinham pela frente, seguiram pelo meu lado (direito) e continuaram pela nossa retaguarda. Tentei segui-los manobrando o carro, mas numa atitude arisca, claro, eles embrenharam-se mato adentro, e então os perdemos de vista.

Tínhamos assim encontrado o nosso segundo BIG FIVE.

Excitação à parte, conseguimos ótimas fotos dos reis da selva, e ali, no habitat original deles.

Mais original impossível, já que estávamos nas savanas africanas!

Seguimos adiante. Na H1-1 (Napi Road) vimos o nosso terceiro BIG FIVE: um elefante, amistosamente devorando uma arvore há uns 50m de onde estava o nosso carro. Ficamos ali um bom tempo, observando-o, já que a nossa expedição pelo Kruger Park estava por terminar, pois estávamos há poucos quilômetros da saída, e aquela era uma área de pouca incidência dos outros 2 BIG FIVE, o leopardo e o búfalo, de acordo com o nosso mapinha do parque.

Em abril, o parque abre às 6h e fecha às 18h. Retornamos ao Numbi Gate exatamente às 17h55min, onde ainda paramos para comprar um tamborzinho e outros artesanatos africanos.

Nosso dia tinha sido ótimo. Numa época em que é quase impossível ver sequer um dos GRANDES CINCO, segundo a proprietária do nosso albergue, tínhamos visto 3 deles.

Já com o tamborzinho nas mãos, saindo da loja, de repente, tive a visão da desolação: avistei a frente do nosso Palio alugado, o carro estava ali, MAS SEM A PLACA!!

- Cadê a placa? Claudia, cadê a placa do carro?? – gritei para ela.

- Peg! Cadê a placa?? – ela repetiu.

- Perdemos a maldita! – concluí.

Tentamos procurar ali pelos arredores, mas nada!

Chegamos à conclusão de que a perdemos rodando dentro do Kruger Park, por causa da trepidação nas estradas, que eram, na sua maioria, de terra e pedras.

Claudia foi explicar a situação para o pessoal do parque. Disseram-lhe que, se alguém a encontrasse, talvez no final do dia seguinte (03/4), poderíamos reavê-la no Numbi Gate.

Sem chance!

No dia seguinte planejávamos conhecer o Blade River Canyon, ao norte de Hazyview, e ainda ir até a Suazilândia (Mbabane, sua capital), bem ao sul de Nelspruit.

Entramos no carro e seguimos para o Big Five Backpacker’s, nosso albergue. Desolados com a perda da placa, vimos no caminho rodas de música africana. Cerca de 20 mulheres negras em forma de círculo se reuniam para cantar em coro e dançar. Do carro, numa velocidade lenta, dava para ver e escutar, ao pôr do sol, seus rituais. Uma verdadeira cena de filme.

Minha preocupação não parava por ali: - Como vamos prosseguir viajando sem placa? E a polícia? – discutíamos.

Entramos num consenso: seguir viagem com naturalidade, e se a polícia nos parasse, falaríamos a “verdade”: que não tínhamos percebido ainda que a maldita havia caído.

Dormimos cedo, após pagarmos a estadia, pois sairíamos às 5h30min, acordando com as galinhas.


03 DE ABRIL

Hazyview/Graskop/Suazilândia/Johannesburg/África do Sul: (5° dia)

Saímos ainda de madrugada, e logo flagramos mais um nascer do sol maravilhoso, com cerração nos vales. Estávamos subindo a serra. O lugar é muito parecido com a serra gaúcha, o que muda um pouco é a vegetação.

Antes de passar por Graskop, a 36km de Hazyview pela R535, fomos até God’s Window (Janela de Deus), que é um mirante com uma vista fantástica, de onde – segundo alguns – sem nebulosidade, avista-se até Moçambique.

Depois, fomos a Berlin Fall’s (Cascata de Berlin) onde, no início da manhã, compramos um elefantinho de pedra de uma vendedora ambulante que ali estava. A primeira de muitas outras que ainda viriam com o passar das horas. Esta tinha uma particularidade: o cheiro de “asa” da mulher era impressionante, chegava a doer as nossas narinas.

Compramos o tal elefantinho e rapidamente saímos dali.

As rodovias da África do Sul são muito boas (pelo menos durante o dia), o asfalto é impecável e o movimento, naquela hora da manhã, era mínimo.

Chegamos então a Bourke’s Luck Potholes, no Mpumalanga National Park. É um parque fechado onde existem formações rochosas incríveis, com passarelas para os turistas atravessarem por entre os paredões.

Fomos os primeiros turistas a chegar ao parque. Nós e os macacos – às dezenas – éramos, naquele momento, os únicos a testemunhar a beleza daquele lugar, mas logo uma excursão de japoneses tomou conta. Estava na hora de bater em retirada, até mesmo porque queríamos, ainda neste dia, tentar ir até a Suazilândia e ainda voltar a Johannesburgo.

Mais alguns poucos quilômetros pela R532, em meio às plantações de pinheiros, subindo serra acima, chegamos finalmente ao mirante do tão esperado Blade River Canyon.

É uma espécie de Itaimbezinho, um cânion imenso, onde a nossa paz de espírito e o pensamento voam tão longe quanto as montanhas que o formam. O lugar é fabuloso e, com o sol já começando a esquentar, mas com uma leve brisa da manhã, acabamos ficando ali por um bom tempo.

Em cada mirante do canyon (paramos em cerca de 04 deles), ao longo da R532, havia muitas tendas de vendedores de artesanatos africanos. Mesmo que não comprássemos nada, valia a pena ficar olhando a rotina das artesãs e dos turistas (que não eram muitos) consumindo, mas não tínhamos muito tempo, pois teríamos que chegar a Johannesburgo ainda durante o dia, se quiséssemos evitar o trânsito noturno da movimentada capital.

Seguimos adiante até The Three Rondavels, ainda no Blade River Canyon - incrível! Três grandes blocos de rocha em forma de cones enfeitam o canyon com uma simetria impressionante.

Eram recém 9h15min, e começamos a regressar em direção ao sul. Paramos ainda em Lisbon Fall’s (Cascata de Lisboa). Graskop seria a nossa próxima parada para almoçarmos e trocarmos dinheiro. Compramos macadâmias, uma espécie de noz, deliciosa, que foi muito útil posteriormente, nas horas de aperto.

Passamos por Sabie e Nelspruit às 12h15min. Até então estava tudo dentro do planejado. Se quiséssemos ir até Suazi e chegar a Jo’burg ainda durante o dia, pelas nossas contas, teríamos que chegar em Nelspruit no máximo às 12h30min, tendo em vista a distância que percorreríamos. Estávamos até adiantados!

Abastecemos o carro em Barbeton, última cidade antes da fronteira. Com o mapa na mão, seria difícil errarmos o caminho até Bulembu, primeira cidade suazi, mas não foi bem assim.

No trajeto, começamos a subir imensas montanhas numa estrada sinuosa e sem absolutamente nenhum movimento. A paisagem realmente era lindíssima, mas as horas passavam e nada do posto de fronteira do povoado africano de Josefsdal. O asfalto acabou e uma bifurcação apareceu junto com a estrada de chão. Já tínhamos andado demais, mas a bússola que eu levava comigo estava marcando tudo certo, estávamos indo efetivamente em direção ao sul.

Talvez a distância no mapa estivesse errada.

Exatamente neste ponto, 2 homens estavam parados, não sabemos até hoje o que eles faziam ali, pois o lugar era totalmente ermo e o próximo povoado estava muito distante dali.

Nesta hora, pedir informação era uma necessidade!

Parei o carro e Claudia perguntou:

- Onde fica Josefsdal? Barbeton?

- É só seguir em frente! As 2 almas insólitas nos responderam.

Beleza! Estamos certos! O alento tomou forma de palavras.

A coisa então piorou, a estrada com muitas pedras, fazendo o Paliozinho sacolejar, contornando penhascos e não terminando jamais - resolvemos parar e pensar um pouco.

A bússola estava correta, mas a distância estava definitivamente errada. Neste momento, com certeza já tínhamos atravessado a fronteira com a Suazilândia há muito tempo, mas no mapa, não sabíamos onde estávamos. Já tínhamos andado mais de 30km na estrada de chão e não havíamos chegado a lugar nenhum!

Uma pitada de pânico pairou no ar por alguns instantes.

Parei o carro exatamente em uma curva, onde se avistava cerca de 50km à frente, o local era muito alto, e não enxergávamos nem sinal de qualquer tipo de civilização.

O som era de absoluto silêncio, só se ouvia alguns pássaros, e o visual era maravilhoso, mas o tempo rugia e o destino, ahhhh...este ninguém sabia onde estava.

Resolvemos voltar e adiar a nossa viagem para a capital da Suazilândia, pois estava perigoso, nem sabíamos onde realmente estávamos.

Retornamos até Nelspruit pela R40, já passavam das 15h e ainda tínhamos 360km pela frente, inevitavelmente enfrentaríamos a noite na chegada a Johannesburg.

Na freeway que leva a Jo’burg (N4), a viagem foi muito tranquila. Vimos do carro um pôr do sol lindo, mas a noite caiu e a adrenalina aumentava à medida que a metrópole sul-africana se aproximava.

Com o mapa de Jo’burg na mão, a Claudia tinha uma certa idéia de por onde deveríamos seguir para chegarmos ao albergue (Backpacker’s Ritz) novamente, mas a realidade traiu a teoria.

O trânsito estava um inferno, entramos na cidade a 120km/h, velocidade insanamente adotada por todos naquela via. Sem termos a menor noção de para onde ir, paramos num posto de combustível para pedir informação.

Prontamente um homem que estava abastecendo seu carro ali se disponibilizou a nos guiar até o Hyde Park Shopping Center, onde nós, há 3 dias, tínhamos almoçado. Sem acreditar na nossa sorte, aceitamos instantaneamente.

Esperamos o homem abastecer e começamos a segui-lo.

Ele já arrancou com o seu carro “queimando pneu”, parecia estar fugindo de alguém. Tentando acompanhá-lo, eu também ia “costurando” o trânsito numa velocidade desvairada.

Ele parecia que estava fugindo, e nós, o perseguindo.

Depois da brincadeira de mocinho e bandido, ele parou o carro numa sinaleira, saiu de dentro, veio até o nosso, e disse que aquele era o local procurado. Então, seguiria agora para o lado contrário, se despediu e sumiu no meio do trânsito caótico.

Quando abriu o sinal da sinaleira, não sabíamos o que fazíamos, nem onde estávamos. Novamente paramos e pedimos informações ao motorista de uma van, que nos disse para segui-lo. 

Alguns quilômetros adiante, achamos a entrada do albergue e virei à direita. Nesse momento, senti como se uma tonelada saísse das minhas costas. O cansaço era grande, nem tanto físico, mas mental. O trânsito de Johannesburg enlouquece qualquer um!

Chegamos às 19h30min, e quem estava lá?!? O Jim Carrey disfarçado, Gavin era o seu nome.

Evitei contato para não dar problemas, hehehe...Dormiríamos esta noite ali, e no dia seguinte teríamos que entregar o carro às 9h no aeroporto, como combinado com a locadora, já que o nosso vôo para a Índia estava marcado para as 12h15min.

No Backpacker’s Ritz, havia um bar no subsolo, estilo pub irlandês, muito bacana por sinal. Depois do banho, das arrumações das mochilas, de acertarmos com o motorista da van do albergue para o seguirmos até o aeroporto no dia seguinte (no melhor estilo “corra que a polícia vem aí”), descemos até o pub para tomarmos uma cerveja africana.

O ambiente estava meio estranho, "festa estranha com gente esquisita". Tinha um irlandês que me pediu um Marlboro em troca de um Camel, e depois se exibia com o cigarro na mão:

- Olhem! Um “Marlboro”! Um “Marlboro”!

Na hora eu não entendi, e depois ele explicou:

- Na África do Sul, não existe “Marlboro” e, na Irlanda, uma carteira custa ₤5, uma verdadeira fortuna!!

Havia também um grupinho de britânicas (horrorosas, por sinal), que só falavam de pênis, e riam descontroladamente.

Finalmente, e para completar, a presença de Gavin, o clone do Jim Carrey, torrando a paciência de todos que se aproximassem.

Tomamos nossa cerveja sul-africana e “ralamos” dali.

O dia tinha terminado, e a minha expectativa com mais um voo intercontinental aumentava. Além disso, a placa perdida do carro não saía da minha cabeça, seria definitivamente um stress desnecessário.


04 DE ABRIL

Johannesburg/Gauteng/África do Sul: (6° dia)

Um dia de domingo de sol lindíssimo raiou, descemos até a recepção e tomamos um susto. O motorista da van disse que não iria mais para o aeroporto!

Pronto! Já estava me acostumando com as incertezas e inseguranças da viagem.

Não sei o que aconteceu com os acertos do pessoal do albergue, mas apenas que virou e mexeu e acabou resultando na ida do zulu até o aeroporto. Para o nosso alívio.

Quando entramos no carro, uma única certeza: mais uma etapa do rally pelas ruas de Johannesburg nos esperava.

Mais um ledo engano. Era domingo, as ruas estavam abandonadas às moscas e o único trânsito que existia era o da sujeira voando nas ruas.

Chegamos ao Johannesburg International Airport às 7h30min. Entramos pelo pátio de devolução de veículos para entregar o nosso Palio. Na hora do acerto de contas, a Claudia justificou que não tínhamos como saber se a placa estava solta ou não, que ela se soltou sozinha, talvez por causa da trepidação das ruas, etc.

Definitivamente, em viagens, o que é esperado nem sempre acontece, e é por isso que o inesperado às vezes acontece. Talvez a Lei de Murphy não nos acompanhasse ali.

A funcionária do balcão da locadora de veículos nos liberou sem sequer debater a justificativa apresentada pela Claudia. Depois de fazer os cálculos da quilometragem, soubemos que tínhamos andado 1534km pela África do Sul! E nos perguntávamos:

- Como é que conseguimos? E sem ter “acontecido nada”?

Pegamos as nossas mochilas e fomos para a área de check-in.

Um dos principais aeroportos do continente africano, o Johannesburg International Airport, pela sua localização, é ponto de conexão entre continentes. A miscelânea étnica é explícita, e nas telas eletrônicas de avisos de embarques de aeronaves, dá para perceber que estamos realmente do outro lado do mundo, bem longe de casa. Um exemplo disso são os destinos ali escritos: Ilhas Maurício, Egito, Mumbai (nosso próximo destino), Ilhas Seychelles, Arábia Saudita, Irã, etc.

Cruzando com muçulmanas com suas “burcas” inconfundíveis, cheguei a pensar em arrancar aquela roupa sufocante de uma delas para ver realmente se embaixo havia uma mulher ou um homem, como eu sempre questionava na época da guerra no Afeganistão. Cheguei a comentar com Claudia essa hipótese, mas definitivamente não seria uma atitude pacífica e certamente me traria graves problemas. Desisti!

Encontramos lá o time de futebol infantil do São Paulo.

O aeroporto estava lotado, com gente vestida com todos os tipos de indumentárias possíveis e imagináveis, mas depois que fizemos o check-in, tudo se tranquilizou. Fomos para a área de embarque e gastamos os poucos rands que haviam sobrado da nossa breve, mas ousada passagem pela África do Sul.


Graskop


Voortrekkers Monument - Pretória


Soweto


Big Five


Numbi Gate - Kruger National Park

Blade River Canyon

Para ler mais sobre a África do Sul, não perca este post incrível sobre o país da Zani Raphaelli, contando da viagem da família com filhas gêmeas de 3 anos em slow travel e muitos esportes radicais

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Marlon Sandri Pegoraro

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8 comentários:

  1. não dá pra esquecer que, segundo nos contaram lá, o Kruger Park tem área equivalente à de Israel, ou seja, é do tamanho de um país inteiro, e faz fronteira a leste com Moçambique - a gente rodou o dia inteiro e vimos apenas um pedacinho pequeno do parque, até porque tem q andar bem devagar lá dentro! mas é um lugar mágico, nós parecíamos (e nos sentíamos) 2 crianças, o tempo todo, tamanha era a nossa alegria com cada novo bicho q a gente via - é incrível ver os animais soltos no mato, no habitat deles, em plena África, podendo ir aonde bem entenderem! não tem nada a ver com qualquer zoo - lá quem fica preso, enjaulados dentro dos carros, somos nós, e a gente tem a chance de ver os bambis mamando nas mães, os elefantes tomando banho, os rinos fazendo xixi, heheheh...eu quero voltar lá muitas vezes!!!

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  2. Puxa, que bacana esse relato!!!! Adorei e falando sério..... quando aqueles leões vieram na direção de vocês, não deu frio na barriga não??? Um beijo

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    1. Hahahahah claro, Debora! Mas mais que medo, deu uma baita empolgação!

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  3. Ri demais... principalmente quando disse que o cara tomou uma cartela inteira de Lexotan. E o cara acordou? rsrsr

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  4. Estou começando a planejar uma viagem com nossos filhos, você acha que seria viável irmos por conta própria, digo, alugamos um carro e fazermos o passeio pelo Kruger sem guias? Quero muito viabilizar essa viagem e os pacotes são muito caros.

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    1. Claro, Cynara, foi justamente isso que fizemos! E a África do Sul é super civilizada, super primeiro mundo, não é aquela "África" que a gente imagina, sabe? Nós também estamos planejando uma longa viagem pela África para 2017 :) vamos trocar figurinhas!

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  5. Ótimo Claudia. Estou começando a rabiscar essa viagem como comentei com você inbox. Vou me aprofundar mais nas pesquisas e pego socorro assim que precisar :).

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